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  • Foto do escritorAPCD JARDIM PAULISTA

O que devemos saber sobre a biologia do causador do COVID-19?

Muitas informações estão sendo transmitidas a respeito do vírus causador da pandemia que logrou parar o mundo em 2020, algumas delas, infelizmente, não verídicas. Como bióloga e cientista sinto a necessidade de compartilhar as descobertas mais recentes sobre o vírus, o que auxilia no entendimento da doença, salienta a gravidade da situação e fornece conhecimento para que os profissionais da saúde possam comunicar e ensinar os seus pacientes sobre as medidas de prevenção que devem ser tomadas e, em um grau mais avançado, possam compreender melhor os aspectos biológicos que circundam esse vírus.

O ICTV (International Committee on Taxonomy of Viruses), órgão responsável pela nomenclatura e classificação viral oficial, definiu o nome do vírus como SARS-CoV-2, causador da doença COVID-19. O SARS-CoV-2 é um vírus pertencente família Coronaviridae, ordem Nidovirales, que apresenta quatro subgrupos (α,β,γ e δ), sendo que, até o presente momento, somente representantes dos dois primeiros subgrupos são capazes de infectar seres humanos. O SARS-CoV-2 pertence ao subgrupo β, é um vírus que possui como material genético uma única molécula de RNA e possui o morcego como o seu reservatório natural.

Muitos devem lembrar-se do SARS-CoV, causador do SARS (Severe Acute Respiratory Syndrome), epidemia ocorrida em 2003, que infectou 8098 indivíduos, em mais de 26 países, com uma taxa de mortalidade de 9%. Este vírus, também pertencente ao subgrupo β, apresenta uma homologia de quase 80% com o vírus atual e compartilha o mesmo mecanismo de entrada na célula hospedeira, por meio da ligação com o receptor da enzima ACE2 (enzima conversora de angiotensina). Ao ligar-se ao receptor, a partícula viral funde-se com a célula hospedeira por meio do sistema endossomal. Foi demonstrado que estes vírus são indutores potentes das citocinas inflamatórias o que é postulado como o mecanismo causador do dano aos órgãos observados em alguns dos pacientes com sintomas mais graves.

Outras características em comum com os dois vírus citados estão na presença de genes específicos na ORF1 (Open Reading Frame – refere-se à matriz de leitura gênica que pode ser traduzida em proteínas) que codificam para proteínas virais de replicação, formação do nucleocapsídeo e das proteínas com forma de espigão, presentes na superfície viral e que são responsáveis pelo ancoramento da partícula com a célula hospedeira. Apesar da grande similaridade entre os genomas destes dois vírus, algumas diferenças interessantes foram detectadas, como a ausência do gene responsável pela codificação da proteína 8a e diferenças nos números de aminoácidos em outras proteínas no vírus SARS-CoV-2. A diferença mais notável, no entanto, refere-se à organização gênica que codifica para a proteína responsável por formar o espigão na superfície viral, que aparenta ser o resultado de uma recombinação homóloga entre o SARS-CoV e um Beta-CoV não identificado, o que poderia explicar o aumento significativo da capacidade do SARS-CoV-2 em ligar-se ao receptor da ACE2. Convém ressaltar que um estudo da Nature demonstrou que tal recombinação ocorreu de forma natural, isto é, o vírus não é fruto de uma fabricação em laboratório. Mutações e recombinações recorrentes é algo comum entre os vírus que podem ou não elevar a sua capacidade de infecção.



A figura 2 deste boletim resume as principais informações a respeito dos sintomas, diagnóstico, prognóstico, formas de contágio e outros dados que são importantes no entendimento geral do COVID-19.

O processo de replicação viral foi simplificado para fins didáticos. Caso queira verificar a replicação de forma mais detalhada, favor consultar o artigo que serviu como base para esta figura: Shereen, MA., et al. Journal of Advanced Research 24 (2020) 91-98 (Referente ao asterisco na figura 1, sobre a replicação viral).


Fontes:

Shereen, MA., et al. Journal of Advanced Research 24 (2020) 91-98 - COVID-19 infection: Origin, transmission, and characteristics of human coronaviruses. https://doi.org/10.1016/j.jare.2020.03.005

World Health Organization – WHO

Jiang, F., et al. J Gen Interm Med (2020) – Review of the Clinical Characteristics of Coronavirus Disease 2019 (COVID-19). https://doi.org/10.1007/s11606-020-05762-w

Andersen, K.G., et al. Nature Medicine (2020) – The proximal origino f SARS-CoV-2. https://doi.org/10.1038/s41591-020-0820-9

Zhou, P., et al. Nature (2020) – A pneumonia outbreak associated with a new coronavirus of probable bat origin. https://doi.org/10.1038/s41586-020-2012-7



Raquel de Souza Lima é bióloga formada pela Universidade de São Paulo (USP) com mestrado em biologia celular e molecular pelo Instituto de Biociência da USP. Durante o mestrado fez estágio na University Medical Center Groningen (UMCG-Holanda) com o objetivo de compreender o papel das proteínas chaperonas e sua atuação em doenças neurodegenerativas. Atualmente desenvolve um projeto para o estudo da doença de Parkinson na Universidade da Costa Rica (UCR).


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